Indústria de carne do Brasil e consumidor pagam mais com exportação maior à China
Pelo Índice de Preços ao Produtor Amplo, da
FGV, a carne bovina apareceu entre os destaques em novembro, com alta de 5,26%,
dez vezes mais do que o visto em outubro.
O Brasil, maior exportador global de carne bovina, está
faturando com a maior demanda da China, mas os consumidores brasileiros estão
por tabela pagando mais pelo produto nos açougues, enquanto frigoríficos têm
sido pressionados a fazer ofertas recordes por bois nas fazendas.
A fome chinesa para preencher o buraco deixado pela peste
suína africana na criação de porcos já é sentida setorialmente nos índices
de inflação no Brasil e ainda pressiona margens da maior parte dos frigoríficos
do país, segundo especialistas.
Com impulso dos chineses, que elevaram as compras de carne
bovina do Brasil em 23,6% de janeiro a outubro, para cerca de 320 mil
toneladas, o país exportou 11% mais no período, para 1,47 milhão de toneladas,
de acordo com a associação da indústria Abrafrigo.
Além da forte demanda da China após novas habilitações de
indústrias de bovinos pelos chineses -- que passaram de 16 no início do
ano para 40 unidades atualmente, segundo a Abrafrigo, um dólar em máximas
históricas frente ao real também favorece as exportações.
"Estamos no auge da captação desses aumentos de preços, a
carne vai continuar subindo e vai impor um desafio para a dona de casa. Quando
a carne bovina sobe, outras carnes também sobem, ainda que não houvesse razão
para isso, elas sobem pela questão da substituição (do produto)", disse o
economista do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre) André Braz, da Fundação
Getulio Vargas, que acompanha índices inflacionários.
Não fossem poucos os fatores de alta, a proximidade das festas
de final de ano gera uma demanda adicional por carnes, há o pagamento da
primeira parcela do décimo terceiro neste mês e uma oferta mais restrita de
bovinos prontos para o abate.
"A gente já está assistindo sim uma alta forte, tem a ver
com sazonalidade, e também com demanda chinesa. Isso gera choque de
oferta", completou Braz, em entrevista à Reuters.
"Com a chegada do décimo terceiro, o consumidor compra
mesmo, e este comprar é o sinal verde para aumento de preços. O dever de casa
seria comprar menos, mas vai dizer para a pessoa não celebrar o final do
ano?"
Pelo Índice de Preços ao Produtor Amplo, da FGV, a carne bovina
apareceu entre os destaques em novembro, com alta de 5,26%, dez vezes mais do
que o visto em outubro.
"Dá para ver que houve um avanço significativo no preço da
carne bovina, já pronta para ir para o açougue", comentou Braz, sobre a
carne mais significativa para a inflação.
Em novembro, Índice de Preços ao Consumidor constatou alta de
6,04% no contrafilé, enquanto em outubro havia subido 2,69%.
"Parte da alta ao produtor é repassada sim, e dado que está
subindo ao produtor, a carne vai continuar pressionando inflação em novembro e
dezembro...", disse Braz.
Isso em momento em que o preço da arroba do boi gordo,
acompanhado pelo indicador Esalq/B3, atingiu um recorde de 204,05 reais na
terça-feira, acumulando alta de 19,54% no mês, segundo o Centro de Estudos
Avançados em Economia Aplicada (Cepea), que também registrou nesta semana nova
máxima histórica para a carcaça bovina na Grande São Paulo, de 13,90 reais/kg.
A inflação no país, no entanto, tem se mantido abaixo do piso da
meta oficial para 2019, de 4,25% pelo IPCA com margem de 1,5 ponto percentual
para mais ou menos.
E quem não vende à China
"A gente sabia que ocorreria uma maior demanda por boi para
abate, mas não nesta magnitude... O número de empresas habilitadas para a China
foi muito significativo", afirmou o presidente da Abrafrigo, Péricles
Salazar.
Segundo ele, aqueles frigoríficos que não têm habilitação para a
China não conseguem repassar para os seus preços a alta da matéria-prima.
"Margens menores. Tenho recebido a seguinte afirmação: está
muito difícil para os frigoríficos que não têm habilitação da China, porque são
obrigados a acompanhar o preço do boi daqueles que têm habilitação...",
disse.
Ele acrescentou que aquelas empresas que não têm habilitação
para exportar à China, que está pagando melhores preços do que outros destinos,
conseguem compensar apenas parte do aumento da arroba bovina, já que o mercado
interno também está em alta.
Diante da forte demanda chinesa, ele disse que o setor espera
ainda este ano novas habilitações de frigoríficos, após cinco unidades de carne
bovina terem sido autorizadas na semana passada, incluindo fábricas da JBS e
Marfrig.
Entretanto, ele comentou que o preço da arroba do boi a mais de
200 reais não é sustentável, e o mercado deve recuar em algum momento. Quando,
ele disse não saber.
Na avaliação de Braz, da FGV, o preço da carne só vai começar a
arrefecer um pouco ao final de janeiro.
"Lá para fevereiro e março a carne começa a devolver uma parte do aumento", comentou ele, condicionando essa previsão a uma normalidade climática para as pastagens, por exemplo.
Fonte: Reuters