Wesley Safadão faz de festival sertanejo uma micareta gigante, em São Paulo
Wesley Safadão recolhe os celulares que os fãs vão atirando sobre o
palco com os pés. Com um dos pés, dá um toque no aparelho e o joga em cima do
outro pé, com habilidade rara de boleiro. Em seguida, ele o joga para cima e
agarra com a mão livre. Faz uma selfie (parece conhecer já intimamente todos os
modelos) e devolve para o fã lá embaixo.
Há diversos motivos que explicam a crescente popularidade de Safadão, e
as embaixadinhas com celulares são o menor deles. O cearense, uma das maiores
atrações da quarta edição do Villa Mix Festival (autodenominado maior festival
de música sertaneja do País), colocou 40 mil pessoas para dançar ensandecidas
no Allianz Parque, na Barra Funda, na tarde deste domingo. Os outros motivos
são uma cascata de convencimento até para os incrédulos profissionais: a banda
dele é ótima (de longe a melhor da maratona que colocou oito das mais
destacadas atrações do gênero na atualidade); seu arsenal de hits desafia a
ginástica binária tradicional do pop sertanejo; ele tem imenso carisma, não é
metido e tem uma picardia no ponto certo, sem descambar para o preconceito e a
grosseria.
Houve diversos momentos de destaque no show de Safadão, mas certamente a
entrada do convidado Nego do Borel, cantando "Não Me Deixe Sozinho",
foi o ponto alto. A estridência carioca do funk melody de Nego do Borel casou
de um jeito bacana com o arrastão de forró que Safadão vinha comandando.
Safadão é o Genival
Lacerda amamentado com açaí
O cearense mostrou uma música nova, "É melhor mexer com o fígado do
que com o coração", e elogiou com constância os colegas da música popular,
com frases como "Todo relacionamento começa com Jorge e Mateus...",
mas sem esquecer de vender o próprio peixe. Depois do ritmo da sofrência,
declarou: "Para dar a volta por cima tem que escutar o Safadão".
Sugeriu às garotas
que ligassem para seus ex ("Oi, seu miséria, tudo bem?"), para
comunicar que, enquanto eles viam futebol na TV, elas estavam se divertindo num
show Safadão. É um Genival Lacerda amamentado com açaí. Safadão
cantou duas músicas com a bandeira paulista nas costas, que alguém atirou. Ao
cantar "Amiga Parceira", pediu que as meninas encarassem a melhor
amiga ali ao lado. "Vai olhar pra ela agora e dizer: eu te amo,
porra!". Depois, para anarquizar, sugeriu que apontassem a "amiga
periguete" e o "amigo corno".
Safadão então convocou "Aquele 1% mais safado do Brasil"
e atacou uma sequência que abalou os alicerces do Allianz Parque: "Praieiro", "País
Tropical"(Benjor), "Não Quero Dinheiro" (Tim Maia). Virou uma
micareta sem fim.
A dupla goiana Humberto & Ronaldo abriu a jornada no
Allianz Parque às 13h, com "Solteiro Sim". Versos de clichê de
convicção masculina, como "Mas é melhor sofrer de ressaca do que sofrer de
amor, porque no outro dia a ressaca já passou", embebiam seus hits, como
"Amigo Cachaceiro" e até a nova música, "Playlist". Foi um
aquecimento, e a cerveja era de graça na pista, incluída no preço do ingresso.
Simone e Simaria
fazem bullying recíproco: "Ela é a gordinha mais gostosa do Brasil,
gente", diz Simaria para a irmã
Às 14h20, a dupla baiana Simone e Simaria desfilou a sua vendetta particular, já consagrada como uma dos grandes duos femininos da atualidade. "Essa cidade foi o lugar onde a gente mais sofreu na vida. Todo mundo dizendo não e não e não, que a gente não ia chegar a lugar nenhum. Mas existe um Deus, um Deus, um Deus", disse Simaria. Destiny's Child do agreste, as garotas alternam forró com sofrência sem deixar cair o pique. Em oposição às duplas masculinas, afirmam orgulho feminino, como em Perdeu: "Você não deu valor e agora perdeu". Cheias de autoconfiança, fazem bullying recíproco ("Ela é a gordinha mais gostosa do Brasil, gente", diz Simaria para a irmã, Simone). E convocam a plateia à moda rudimentar: "É pra meter o chifre no chão e sair arando a terra, gente!".
Matheus e Kauan fizeram o show mais pop, recheado de beats e
reggaes, como "Nosso Santo Bateu". Oferendas aos montes eram jogadas
no palco enquanto rolavam os shows. Jorge, da dupla Jorge e Mateus, se viu
dançando com um urso de pelúcia enquanto cantava "Calma". Seu parceiro,
Mateus, canta em atitude dylanesca, fixo em frente a um microfone centralizado,
de vez em quando empunhando canções com tempero folk, como "Me
Acalma".
Luan Santana
reanima a plateia notadamente feminina, com seu sertanejo romântico
Luan Santana, que entrou depois do set do DJ Alok, reanimou o público,
que já dava mostras de cansaço. Foi uma entrada tipo Xuxa, com muita fumaça e
um off com a voz gravada do cantor contando como sonhava com um violão voador
quando tinha apenas 3 anos. Enxertando em seu show esquetes de hip-hop,
conduzidos pelo seu excelente trio de vocalistas (que também faziam números de
b-boys, dançando e cantando hip-hop), Luan Santana não se desvia, entretanto,
do foco que o sustenta: o sertanejo romântico. Seu público é notadamente
feminino, e lhe tem devoção.
Com 30 anos de carreira completados esse ano, a veterana dupla Bruno
e Marrone pegou um público já rarefeito no Allianz Parque. Mas ainda
assim, muito entusiasmado. A dupla mantém viva a velha escolha da música
sertaneja urbana, feita de dor de corno e conceitos de honra, retratados em
canções ultraconhecidas, como "Vidro Fumê". Marrone começou o show
tocando sanfona, e Bruno empunhou o violão em "Amor de Primavera" e
"Choram as Rosas", logo em seguida. Old school, mas ainda com grande
capacidade de emocionar seu público, os veteranos seguraram os resistentes na
pista.
Muito lotado, o Allianz Parque experimentou uma rebelião das garotas,
que cansaram das filas imensas nos banheiros femininos e invadiram os
masculinos, sem filas. Alguns banheiros transbordaram e criaram uma situação
caótica nas áreas inferiores do estádio. Também houve diversas queixas de
furtos de celulares, mas até o fechamento dessa edição a organização não tinha
números sobre o problema.
Fonte: UOL