Especial Sertanejo: duplas investem no romantismo e nos mega espetáculos
Das rádios AM às FM, dos circos aos programas de TV. Nas décadas de 1980
e 90, os rumos da música sertaneja mudaram significativamente. Com uma roupagem
cada vez mais romântica, falando das dores de amor, os artistas do gênero
passaram a ganhar destaque na mídia.
Certa vez, Xororó disse: “Não adianta a gente cantar a música sertaneja
pensando naquele público que não existe mais, do lampião a querosene. A gente
adora falar do laço, da poeira, isso é muito bonito, mas nas fazendas já tem
videocassete, micro‑ondas e parabólica”. Todos os artistas rurais/interioranos
falam da realidade do campo. Mas é preciso perceber que o campo mudou, e se
mudou o modo de falar dele é porque não podemos ignorar as mudanças estruturais
que vivemos — diz Gustavo Alonso, doutor em História e autor do livro “Cowboys
do asfalto — Música sertaneja e modernização brasileira”.
Em 1979, a dupla paranaense Chitãozinho & Xororó fez barulho com a
canção “60 dias apaixonado”. Mas foi três anos depois, com o estouro de “Fio de
cabelo”, que eles abriram as porteiras do show business para os sertanejos
românticos.
— Essa música é muito importante, não só para a gente, mas pelo cenário
sertanejo em si. Foi com ela que conseguimos romper as barreiras do
preconceito, fomos projetados como artistas nacionais, e tudo isso representou
também um marco na história desse gênero musical — afirma Chitãozinho.
Um público cada vez mais jovem passou a se interessar por esse tipo de
música, que já falava essencialmente de amor. E os artistas começaram a
perceber que os shows também precisavam passar por uma renovação. Foi num
megaespetáculo de rock ‘n’ roll, olhem só!, que os sertanejos buscaram a
inspiração que faltava...
“Quando teve o primeiro Rock in Rio, veio o Yes, aquela banda de rock, e
eles fizeram um show fantástico. Tinha gelo seco que saía debaixo do palco. A
gente ficou louco com aquilo lá. Então nós compramos um jogo de luz parecido.
Construímos um palco todo vazado com grade, as máquinas por baixo e os retornos
embutidos no palco. Nós tivemos de comprar caminhão e ônibus para carregar tudo
aquilo e levar pro cara que não queria saber. Foi aí que a música mudou. O
conceito de sertanejo deixou de ser só viola e violão”, conta Chitãozinho no
livro “Bem sertanejo — A história da música que conquistou o Brasil”, de Michel
Teló e André Piunti.
Poucos anos depois surgia um novo fenômeno musical e comercial chamado
Leandro & Leonardo, vindo de Goianápolis, em Goiás. “Entre tapas e beijos”
e “Pense em mim” viraram hits entre 1989 e 1991.
— Os fãs queriam chegar perto deles, agarrar, ficar com uma parte da
roupa... Uma loucura! Já eram uma espécie de sertanejos pop. Um dos discos da
dupla chegou a quase 4 milhões de cópias vendidas. Eles quebraram as últimas
barreiras do preconceito, dando um novo upgrade na música sertaneja — assinala
Edvan Antunes, autor do livro “De caipira a universitário — A história do
sucesso da música sertaneja”.
Também irmãos e com o mesmo perfil — jovens, bonitos e românticos —,
Zezé Di Camargo & Luciano, vindos de Pirenópolis (GO), consolidaram o
estilo em 1992. Não era mais brega ouvir sertanejo, ao contrário, estava na
moda ouvir “É o amooooor” na maior altura. Aproveitando o ensejo, outras várias
duplas, como João Mineiro & Marciano, Christian & Ralf, Rick &
Renner e João Paulo & Daniel, conquistaram seu espaço.
Se lá no início as duplas diziam que Tonico & Tinoco era uma
referência, hoje não escondem que a maior inspiração é um ícone da música
romântica.
— Roberto Carlos, sempre! Assim como as dele, nossas músicas falam
direto ao coração — afirma Luciano.
Glória e luto
Surfando na onda do sucesso, a Globo reuniu, em 1995, os maiores
expoentes do segmento, na época, para o especial de TV “Amigos”. Leandro &
Leonardo, Chitãozinho & Xororó e Zezé Di Camargo & Luciano vestiram,
literalmente, a camisa da união do mercado sertanejo, que já reinava absoluto
no cenário musical do país.
— Esse não foi um projeto, mas uma reunião de amigos que ganhou destaque
nacionalmente. Esses encontros já aconteciam entre a gente longe dos holofotes,
nas fazendas. Nossa amizade sempre foi real, verdadeira, e persiste através dos
tempos — afirma Zezé.
A explosão de felicidade, contudo, deu lugar à consternação pouco tempo
depois, com duas perdas significativas: em 1997, João Paulo morreu num acidente
de carro; um ano depois, Leandro saiu de cena por conta de um câncer raro no
pulmão. Após períodos de luto, Daniel e Leonardo decidiram seguir em carreiras
solo, com o apoio e o carinho de seu público.
Fonte: Extra